O Léo continua na Finlândia, mas o blog chegou ao fim. As postagens favoritas do autor estão aí para a memória dele e de quem tiver sem nada melhor pra fazer além de ler blog velho. :) Qualquer coisa, entra em contato por e-mail: lecczz@gmail.com.

sábado, 5 de setembro de 2009

Aos imbecis, nem um AUDI ajuda (Audimies)

(A Teea escreveu sobre isso e tem uma opinião bem pessoal a respeito do assunto no blog dela).

A Finlândia tem uma história longa de igualdade entre sexos. Já em 1906, a Finlândia se tornou o primeiro país europeu a garantir o direito feminino à voto e o primeiro do mundo onde mulheres poderiam se candidatar. Pouco depois, em 1930, a igualdade entre marido e mulher foi garantida. Ou seja, leis que pregam o respeito à mulher como cidadãs vêm de muito tempo. A gente que vem de países machistas como o Brasil tende a ver essa situação no dia a dia.

Há um tempo atrás, conversando com um amigo que tinha uma namorada finlandesa (e estava assustado com a atitude forte da garota), eu disse: "mulheres finlandesas são feministas e femininas ao mesmo tempo. Tem que se aprender a viver com isso." Essa dualidade se vê no quotidiano. Quando você, brasileiro, pensa numa mulher motorista de ônibus, ou que trabalhe em uma obra, ou qualquer outro trabalho "pra homem", o que você pensa?

Muitos vão responder: "hum, sapatão" (termo vulgar pra mulheres não-tão femininas, em geral lésbicas). Isso está no nosso subconsciente nutrido com os preconceitos da nossa terrinha. Minha educação me permite policiar e corrigir essas idéias, mas não evitar esse tipo de pensamento (eles vêm e vão rápido, mas vêm). Ou seja, eu quando cheguei aqui e vi meninas bonitas e senhoras retocando a maquilagem atrás de um volante de um ônibus, ou dentro de um macacão de obras, por exemplo, foi um choque.

Essas visões ajudam a desfazer o preconceito que vem impresso na mente latino-americana (pelo menos na minha) e você aprende a entrar no clima e respeitar ainda mais as mulheres como iguais. Outra coisa perigosa - que deve ser evitada se você quiser evitar confusão - é não fazer piada sobre o papel feminino na sociedade. Se você está entre amigos e amigas e sendo claramente irônico, tudo bem. Agora não vá fazer piada em público sobre mulher e afazeres domésticos, ou coisas do tipo, pois vai dar merda. E como se um cara branco faz piada entre negros e macacos no Brasil perto de um negro: tá pedindo pra arrumar confusão. O que surpreende é que há homens finlandeses que, apesar de estarem vivendo aqui a vida toda, parecem que não aprendem. Aí, se fodem de azul e branco.

Essa semana, Esko Kiesi, gerente de vendas da Audi na Finlândia, deu uma entrevista pra uma edição especial da revista Anna pra profissionais (será que ele achou que nenhuma mulher leria?) comparando carros com mulheres (ui!), dizendo que porque mulheres são emotivas elas nunca podem ser chefes (não tão boas quanto os homens) (au!), que se uma mulher se recusa a lavar e passar a relação está comprometida (putz!) e que as mulheres precisam de homens pra cuidar de coisas técnicas (cala-te anta!). Mesmo admitindo que muitos homens mais velhos ainda pensam assim, ele foi brincar.

Advinha a merda que deu.

Choveram críticas de tudo que é lado, é claro. Esko "pediu demissão" do cargo dizendo:

"I am sorry of the hurt and damage that I have caused with my poorly considered statements, which were mainly intended as humour. I have worked together with hundreds of professionals to build a strong Audi brand, and I sincerely hope that my thoughtless action will not negate my years of effort.” [Desculpe-me pela mágoa e prejuízo que eu causei com meus comentários sem um mínimo de consideração, que foram feitos como um pouco de humor. Eu trabalhei em conjunto com centenas de profissionais para construir uma marca Audi forte, e eu sinceramente espero que minhas ações impensadas não venham a negar meus anos de esforço]
Rapidamente, em paródia à uma música antiga conhecida como Apinamies [Homem-macaco, tipo troglodita], os famosos Aamupojat [Garotos da manhã] da Rádio NRJ - que fazem um programa de humor e notícias ao estilo da Rádio Transamérica - criaram a música Audimies (Homem-Audi) que já é um hit no país. Ouça e veja a letra traduzida abaixo.



Audimies, Audimies, mä oon Audimies
[Homem-Audi, Homem-Audi, eu sou o Homem-Audi]
Sinussa on roimaa audimiehen voimaa
[Você tem a força bruta de um Homem-Audi]
ota minut kyytiin, Audimies
[vamos dar uma voltinha]
Suojaan luksuskaaraan kantaa voisit naaraan
[você pode proteger a fêmea no carrão de luxo]
oisit mulle machoin, Audimies, kenties
[você seria o mais macho, Homem-Audi, talvez]
machoin, Audimies
[o mais macho, Homem-Audi]

Ei lattakenkäfeministit kelpaa sulle laisinkaan, jee jee jee
[Você não é afim de feministas sem salto alto, ié ié ié]
korkkareista toisenlaisen potkun saat
[You get other kinds of kicks of high heels (ñ dá pra traduzir a piada pro Português]
silitys on hyvä, siivous on hyvä
[Passar roupa é bom, limpar é bom]
kunhan nainen tekee sen
[Se é a mulher quem faz]

Sinussa on roimaa saksalaista voimaa
[Você tem a força bruta alemã]
parkkeeraa mun talliin Audimies
[Coloca o carro na minha garagem, Homem-Audi]
Sä haluut nuoren naisen
[Você quer uma mulher nova]
kauniin, kuuliaisen
[bonita e obediente]
silittämään paidat, Audimies, kenties
[Pra passar sua camisa, Homem-Audi, talvez]
siistipaitainen Audimies
[um Homem-Audi de roupa limpa]

Ei tasa-arvoyhteiskunta maistu sulle laisinkaan
[A igualdade não cheira bem pra você]
Anna-lehden juttuun pääsit aatteitasi laukomaan
[Você tem a chance de ter voz na revista Anna]
Nainen, sä oot sorja, tunteittesi orja
[Mulher você é escrava das suas emoções]
Et sä pysty johtamaan
[Você não tem condições de ser chefe]

Sinussa on roimaa Audimiehen voimaa...

Sinussa on roimaa saksalaista voimaa...
Agora vamos esperar a reação da Audi pra tentar mudar essa relação da marca com esse tipo de pensamento. Enquanto isso, Esko vai sendo homenageado cada vez mais por aí na web.