Imagina esse caso: uma enfermeira de 20 e poucos anos mata dois velhinhos no hospital onde trabalhava. Depois de dois anos, ela é julgada, condenada e se mata na cadeia. Se fosse no Brasil, como a notícia saíria? Pois o caso aconteceu na Finlândia. Vejam como eles cobrem essas informações aqui.
Essa primeira notícia é de Novembro de 2007, na época do crime. A manchete diz algo como: "Enfermeira envenenou pacientes deficientes sob seus cuidados?"
Algumas coisas me chamam atenção.
A primeira é que o nome da então suposta assassina não é divulgado. Num tem nada do tipo "Fulana é a principal suspeita", com a foto dela do lado. Por que? Simples. Se ela é suspeita, ela ainda pode ser inocente. Se ela é acusada no jornal, ia ser difícil convencer as pessoas do contrário mesmo que ela não tenha culpa.
A segunda é que o nome das vítimas também não aparece. Nem há entrevistas emocionadas com os parentes. Afinal, o caso em si é a notícia, não os mortos e a família. Dar nomes e explorar a dor alheia num é informação jornalística, é fofoca de mau gosto.
A terceira é a foto. Num tem corpo. Num tem foto dos pacientes mortos (mesmo que vivos e sorridentes). Só a parede do local onde o crime aconteceu (e a matéria faz questão de não acusar a instituição).
Aí, essa semana, aparece a notícia de que a assassina (já julgada e condenada) se matou na cadeia. Como a notícia sairia nos jornais do Brasil? Aqui, saiu assim:
Agora, depois de condenada e morta já aparece o nome. Eu vi outras matérias de 2008 e desse ano (por conta do julgamento) no mesmo jornal que o nome dela ainda não aparecia.
Mas reparem a foto: apesar de ser assassina, a foto que usam dela passa paz, como se ela rezasse. Tenho certeza que eles tinham outra foto, inclusive algumas onde ela apareceria descabelada e com cara de doida, mas ainda assim usaram essa.
Além disso, eles não mencionam em momento algum (há dois anos e pouco já) o nome das vítimas. Não tem entrevistas com os parentes chorando dizendo: "Justiça foi feita, meu Deus!!!" depois do julgamento. Num tem foto dos mortos pra lembrar o caso original.
É como se não houvesse circo. Só informação de um crime (assunto público) sem a exploração do drama alheio (assunto particular). Quer outro exemplo? Foi assim que a notícia saiu no site da Yle, empresa de informação estatal:
Sem nome. Sem foto com sangue ou olhos virados. Sem nada. Só a informação da morte concluindo a história que começou em 2007.
Em tempo: o Ilta Sanomat - junto com o Ilta Lehti - é um jornal considerado popular e sensacionalista. Como o "Meia-hora" ou "Expresso" no Rio. Talvez o falecido "Notícias Populares" em São Paulo. Ou seja, mesmo os sensacionalistas são bem moderados se comparados aos nossos. Aí ficam as perguntas:
Em tempo: o Ilta Sanomat - junto com o Ilta Lehti - é um jornal considerado popular e sensacionalista. Como o "Meia-hora" ou "Expresso" no Rio. Talvez o falecido "Notícias Populares" em São Paulo. Ou seja, mesmo os sensacionalistas são bem moderados se comparados aos nossos. Aí ficam as perguntas:
- Esse comportamento da mídia é coisa da Finlândia ou no Brasil poderia também existir um jornalismo diferente?
E o mais intrigante: na faculdade, muitos professores jornalistas diziam que violência vende jornal/dá audiência.
- Será que um jornal/canal de TV que informasse sobre casos de violência como fizeram nestes exemplos acima venderia/teria audiência?